Os Transtornos Hemorrágicos na Adolescência

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Ter um filho com hemofilia ou outro transtorno hemorrágico na adolescência pode trazer vários desafios. O período de transição entre a infância e a vida adulta, chamado de adolescência, é uma fase na qual a criança passa por um processo de maturação física, cognitiva, emocional e social, que gera um novo repertório de comportamentos que podem causar estranheza em seus pais e familiares.

Adolescentes podem pensar e se sentir como adultos, mas também podem se comportar como crianças. A explicação é neurobiológica: algumas regiões cerebrais, responsáveis pela sua autorregulação, amadurecem mais tardiamente.

Apesar da atuação do hormônio sexual ser importante na adolescência, o órgão que comanda essas mudanças, inclusive a produção do hormônio sexual, é o cérebro.  A última parte do cérebro a amadurecer é o córtex pré-frontal, ou seja, exatamente a região onde se processam os comportamentos conhecidos tipicamente como de adultos. São eles: capacidade de planejamento, concentração, inibição de impulsos e empatia.

Com o amadurecimento do córtex pré-frontal, o adolescente vai se aproximando do mundo adulto, mas isso não acontece de maneira uniforme. Nessa fase, começam a se desenvolver o comportamento autorreflexivo, a autorregulação e o raciocínio, levando a uma maior consciência crítica de si e dos outros.

Por isso, o adolescente é mais irritadiço e questionador, diferentemente da criança, que costuma acatar o que lhe é imposto como regra. Como seu cérebro ainda está se consolidando, as oscilações de humor são comuns nos adolescentes, assim como o comportamento reativo. Eles começam a olhar o mundo de forma mais profunda, mas o lado emocional não está totalmente amadurecido. Por isso surgem embates com os adultos e com a família. Além disso, eles são mais impulsivos, reativos e intensos. Percebem as contradições, mas não sabem como lidar com elas de modo adequado.

Se, por um lado, a maturidade emocional do adolescente oscila, é nessa fase também que ele começa a ter a capacidade de tomar decisões, julgar e planejar. É uma região atrás dos olhos, chamada córtex órbito-frontal, que promove a capacidade de usar emoções para nortear decisões e de criar empatia pelos outros. Esta região é uma parte do córtex pré-frontal e é a última a formar-se totalmente. Daí se entende a dificuldade dos adolescentes em planejar, julgar e, principalmente, tomar decisões baseadas em emoções de modo amadurecido e adequado.

Outra mudança fundamental ocorre no sistema de recompensa do adolescente: eles precisam de experiências mais intensas, que estimulam mais a liberação da substância dopamina para sentir prazer. Essa circunstância é a principal responsável pela maioria dos comportamentos típicos do adolescente, como a busca de novidades, os excessos (como ouvir música alta, praticar esportes radicais) e o comportamento de risco, que também gera euforia e produção de dopamina. Sem falar na nova e mais importante descoberta: o sexo, cujo prazer só é possível porque o sistema de recompensa se torna sensível aos hormônios que promovem o prazer sexual. É a procura pelo prazer o que move o adolescente a descobrir coisas novas e a buscar independência.

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Na adolescência, a causa principal de morte são os acidentes que, em geral, são causados por comportamentos de risco.

Para pessoas com coagulopatias, o risco é ainda maior pois, além do risco real ligado à situação, há o fato de que, se esta pessoa precisa de um atendimento emergencial, há a necessidade de infusão de fator de coagulação imediatamente ou o mais breve possível, em dose adequada e também de uma conduta específica, dependendo do tipo de emergência. Para que esse atendimento exista, é necessário que o paciente esteja identificado como uma pessoa com coagulopatia e tenha doses de seu pró-coagulante (fator) disponíveis.

É de fundamental importância que os adolescentes sejam estimulados a manter a profilaxia durante a adolescência, mesmo se houver resistência, e que tenham doses e frequência flexíveis, de acoro com sua rotina. É o tratamento que deve ser adaptado à rotina do paciente e não a rotina dele que deve se adaptar ao tratamento. Nesta fase, cabe aos familiares uma dose extra de paciência e colaboração, caso o adolescente tenha preguiça ou não queira fazer as infusões.

Um dos motivos principais do comportamento de risco é a influência do meio social. Os adolescentes são levados a impressionar os amigos, em busca de aprovação, enquanto também vão se tornando mais independentes dos pais.

O encontro de um cérebro em formação com o comportamento de risco, como consumo de álcool e/ou de drogas, é o ponto de maior vulnerabilidade da adolescência. O risco de dependência é maior, porque o jovem está numa fase de experimentação. Dependências adquiridas podem permanecer durante a vida adulta. As descobertas sobre esse período da vida ajudam a lançar um olhar novo sobre o adolescente e a reconhecê-lo como alguém que não está pronto e que, por isso, precisa ser acolhido e orientado.

O acolhimento e a orientação antes e durante a adolescência realizados, tanto pelos pais e familiares, quanto pelos profissionais da equipe multiprofissional do Centro de Tratamento da Hemofilia (CTH), são fundamentais para que o adolescente não se coloque em risco, mas antes adquira o desejo de compartilhar suas experiências, seus medos e suas conquistas.

O adolescente deve ser envolvido em atividades interessantes para ele, passatempos atraentes e significativos, esportes seguros e outras atividades que permitam focar sua atenção em algo saudável. Deve interagir com outros adolescentes que têm interesses semelhantes aos dele e ser levado a refletir sobre a importância do autocuidado e de manter hábitos saudáveis.

Tanto o adolescente com coagulopatia, quanto seus familiares, caso sintam vontade, podem buscar ajuda de profissionais de saúde mental da equipe do CTH. Cuidar da saúde mental do adolescente é fundamental.

A adolescência é uma fase característica e o cérebro do adolescente apresenta suas peculiaridades. Ambos precisam ser respeitados.